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Pedro Figueiredo: o escultor da Cindazunda que ganhou fama além fronteiras

Do processo criativo à resistência da família à profissão que escolheu, conheça o artista de emblemáticas e polémicas peças.
Pedro Figueiredo e a sua estátua da princesa Cindazunda.

A arte não se explica como a lógica, mesmo que ela seja pensada ao pormenor pelo artista. A obra do escultor guardense, Pedro Figueiredo, 48 anos, dos quais 31 dedicados à arte, sugere-nos reflexão. O autor da Cindazunda, na zona do Arnado, em Coimbra, contou à New in Coimbra que não entrou no mundo da escultura de uma forma direta. 

No início fez um curso profissional de cerâmica, durante três anos na ARCA — Escola de Artes de Coimbra, de 1994 a 1997, e logo percebeu que a escultura lhe dava liberdade na técnica e na estética. “Julgo que o incentivo para mim, começou no gosto pelo desenho e pelas formas. Em termos académicos identificava-me muito mais com o desenho dos escultores do que dos pintores. Os escultores procuravam mais a forma, o desenho era mais tridimensional e riscado, o que me agradava. Por isso, não hesitei na hora de decidir qual o caminho a seguir”, assegura.

O prémio revelação da XII Bienal de Arte Internacional de Vila Nova de Cerveira, 2003, trouxe-lhe entusiasmo e motivação. Embora no início a sua opção não tivesse sido muito compreendida no seio familiar, porque existe a ideia de que a carreira nas artes não tem futuro. “Não se encaram as artes plásticas como outra profissão qualquer, há uma tendência a vê-la como um hobby. O meu trajeto não foi fácil. Muitas vezes é angustiante trazer coisas novas a partir daquilo que ainda não existe, que ninguém viu, e eu faço disso uma necessidade, procuro e tento encontrar-me nisso todos os dias”, acrescenta o artista.

Cindazunda, no Arnado, em Coimbra.

Segundo Pedro Figueiredo existe uma receita fundamental para fazer escultura: o trabalho. O público identifica a sua arte por aquilo que o torna diferente dos outros artistas, pelas formas, expressão e dimensão, quando se consegue isso, descobre-se a sua linguagem e, também, a identidade. Diariamente no seu atelier, com cerca de 700 metros quadrados, lida com o erro e o acerto, e é nessa aprendizagem que transforma e surge a obra. “Na arte, erro e acerto andam de mãos dadas, a experiência leva-me a tirar partido do erro”.

O processo de uma escultura passa por modelar o barro e o gesso, e como produto acabado, a resina de poliéster e o bronze, e algumas vezes, também, o metal e a madeira. “Não se pode fazer um bom trabalho sem técnica, como é óbvio, no entanto, a criatividade é fundamental, o conceito, a imaginação tem tanta importância como a forma, que está sempre explícita no olhar de quem usufrui da obra. Técnica e imaginação tendem a fundir-se, fazem parte uma da outra”.

Para um escultor figurativo, como se considera Pedro, as suas referências passam por Rodin que “é obrigatório”, depois Constantin Brancusi que diz adorar, Degas, pelas bailarinas, Henry Moore e o principal, Wilhelm Lehmbruck.

A forma é o âmago da sua obra, é essa a originalidade que lhe dá dimensão e relevância, e a torna visível. “Não faço nada que não goste, posso dizer que prefiro fazer mais um tipo de escultura do que outro. Quanto mais criativa for a obra, mais gozo me dá, mas não consigo dizer que tenha feito um trabalho que não tenha gostado, consigo tirar sempre prazer no trabalho artístico”.

Escultura na Guarda, foto de Hugo Pinheiro.

Há algum hedonismo nesta forma de olhar o seu percurso, uma nostalgia do prazer onde põe as mãos todos os dias. Criador e criatura num diálogo imprevisível, com obras imponentes que dá vida à paisagem urbana, como a Princesa Cindazunda, na Avenida Fernão de Magalhães e o busto de António Arnaut, autor da lei que criou o Serviço Nacional de Saúde (SNS), no Parque Dr. Manuel Braga, em Coimbra.

O artista confessa que para ele há algo espiritual a que se sente ligado e que não sabe explicar em palavras. “Só consigo sentir, vem muito do inconsciente. O trabalho de um artista não é assim tão controlado como as pessoas pensam, às vezes, não controlamos, sai-nos e pronto, está feito. Por este motivo, há coisas que só acontecem uma vez e são irrepetíveis, esse é o verdadeiro segredo”.

Não há rotina para quem vive na arte, as viagens e o contacto com novas culturas são fundamentais, assim como as conversas com pessoas de outras áreas, esse é o alimento necessário para o crescimento artístico e a constante atualização. Para cada obra o escultor tem um tempo de estudo que precede a execução.

Quando a obra termina há uma nova vida, sai do atelier e mostra-se ao mundo, deixa de ser do artista, ou seja, é a partilha do silêncio e do processo criativo que está lá, mas que não se vê, embora se possa imaginar. “A crítica do público vem depois, se é positiva ou negativa, isso não considero o mais importante, o fundamental, é que não fiquem indiferentes à minha obra, quero sempre que ela inquiete, que ajude a refletir e que, no fim, seja uma promessa de felicidade”.  Pedro diz não saber o número exato das suas obras em Portugal e no estrangeiro, gosta de brincar, é irónico e afável mesmo quando o assunto é sério. A sua esperança nasce na obra que ainda não nasceu, uma espécie de metáfora do futuro.

Pedro Figueiredo com “Coração – Cápsula do Tempo” no Centro Escolar da Chamusca.

“Não realizei tudo o queria, nem quero que isso aconteça, porque se isso acontecesse não trabalharia mais, o artista é um eterno insatisfeito. Sou daqueles que acredita que uma das missões dos artistas é adivinhar o futuro e, ao mesmo tempo, preparar e abrir novas mentalidades nas pessoas. Por outro lado, quero viver o presente com intensidade. O presente é o pré-sente”, conclui Pedro.

A obra e a carreira artística de Pedro Figueiredo resultam de muito trabalho, da resiliência e do amor que tem pela arte. “No dia em que morrer, tudo ficará consumado, depois podem tirar conclusões e saberem se valeu a pena. Porque no fim, tudo pode estar certo ou não, nunca saberemos”, remata.

A sua próxima exposição será em Pontevedra, Espanha, de 23 a 27 de novembro na Feira Culturgal, a maior e mais importante feira cultural da Galiza. Nessa exposição trabalhará ao vivo numa escultura em gesso direto. Além disso, este ano, Pedro Figueiredo representa Portugal na Bienal Internacional de Arte de Vila Nova de Cerveira.

De seguida, carregue na galeria para conhecer as obras do escultor Pedro Figueiredo.

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