“Havia um certo receio do desconhecido”, reconhece Eurico Romaguera Gonçalves, logo no início da conversa com a NiC. O surfista profissional de 29 anos enfrentou as adversidades da Gronelândia para realizar algo extraordinário: surfar uma onda provocada pelo desprendimento de um bloco de gelo um glaciar. Conquistou o feito no dia 3 de agosto.
“Fui o pioneiro; ninguém o tinha feito. Foi necessário um trabalho psicológico extenso para conseguir lidar com as condições atmosféricas, mas tivemos muita sorte”, partilha o jovem natural da Figueira da Foz.
A ideia surgiu após uma viagem à Noruega, que realizou com o surfista espanhol Jorge Abian e os pais de ambos. O plano era desafiar-se a surfar e esquiar uma encosta, culminando num encontro final.
“Tivemos o azar de enfrentar uma tempestade durante essa viagem e não se reuniram as condições necessárias para que tudo corresse conforme o desejado. Assim, decidimos fazer um segundo desafio e pensámos na Gronelândia.”
O pai de Eurico também é profissional da modalidade e transmitiu-lhe a paixão desde tenra idade. Aos 23 anos, o surfista decidiu profissionalizar-se e optar pela vertente tradicional do surf. “Utilizam-se pranchas maiores, semelhantes às dos anos 1960 e 1970, e, além disso, não existem competições. Deste modo, consigo ser muito mais livre e criativo.”
Eurico almeja explorar os seus limites e as capacidades das pranchas de surf tradicionais. Atualmente, dedica o seu tempo a viajar pelo mundo, captando imagens e vídeos impressionantes. Apesar de ter aceitado o desafio, admite que considerou recusar até à última hora.
“A primeira coisa em que pensei foi conferir a temperatura da água. Depois, comecei a ponderar os riscos de nos cruzarmos com tubarões, orcas ou baleias. À medida que investigava, ficava cada vez mais apreensivo, mas decidi arriscar. Afinal, o que poderia correr tão mal?”, comenta com uma pitada de humor.
A escolha da localização do glaciar foi meticulosamente planeada para garantir a melhor onda possível, assim como a seleção de um período do ano em que as condições são mais favoráveis. Antes, realizaram uma análise e exploração aérea e marítima da área para determinar o local ideal para se posicionar.
No primeiro dia, passaram cerca de oito horas à espera que algo acontecesse e, apenas na segunda tentativa, após muito tempo, conseguiram assistir ao descolamento de um bloco de gelo e surfar a onda. “Foi perfeito; nem muito pequeno, nem muito grande, o que diminuiu os riscos”, realça.
A preparação para este momento foi sobretudo psicológica, para evitar desistir. “Nunca tinha estado em situações tão extremas. Foi uma viagem muito exigente em termos de duração e temperaturas, além de não termos água quente nem eletricidade.”
Eurico utilizou um fato de neoprene significativamente mais grosso que o habitual: seis milímetros, em vez dos quatro a que está acostumado. Além disso, necessitou de luvas, gorro e botas para manter o corpo minimamente aquecido na água que estava a uns impressionantes dois graus negativos.
Neste momento, já de volta à Figueira da Foz, integra a organização do festival Gliding Barnacles, que conjuga surf com arte e música e irá decorrer entre 18 e 22 de setembro.
No futuro, tem programadas viagens à Madeira e ao Havai para surfar e captar imagens deslumbrantes, mas não descarta a possibilidade de participar novamente num desafio extremo. “Se for bem-planeado e houver uma missão devidamente estudada, não vejo razões para não o fazer. É uma experiência incrível.”
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