“E depois do amor, e depois de nós. O dizer adeus, o ficarmos sós. Teu lugar a mais, tua ausência em mim. Tua paz que perdi, minha dor que aprendi. De novo vieste em flor, te desfolhei.” Português que se preze sabe de cor esta canção. Ao final de contas, foi este o tema que representou o nosso País na mais recente edição da Eurovisão. A final decorreu a 6 de abril deste ano em Brighton, no Reino Unido.
O artista responsável pela faixa é Paulo de Carvalho, de 27 anos. Apesar de a Suécia ter vencido o festival — graças a “Waterloo”, dos ABBA — o músico deixou Lisboa orgulhoso, a cidade à qual chama de casa, e toda a nação.
“E Depois do Adeus” foi escrito por José Niza, que se inspirou nas cartas que enviava à mulher quando estava no mato de Angola durante a guerra colonial, onde tinha o papel de alferes. A letra toca em temas como a esperança e a saudade — tão típicos dos portugueses.
Apesar de se ter tornado num artista conhecido internacionalmente graças à sua participação na Eurovisão, onde terminou com três pontos, Paulo continua a ser um jovem adulto que gosta de ir às boates para dançar com os amigos. Só não gosta de beber álcool — quando tinha 15 anos bebeu demais e até aos dias de hoje sente-se enjoado só de pensar em cerveja ou vinho.
O tema que levou ao Reino Unido não foi o primeiro êxito da sua carreira. Antes de se ter estreado em palcos internacionais, já era um rosto conhecido entre os portugueses. Há cerca de três anos, em 1971, participou pela primeira vez no Festival da Canção, da RTP, com “Flor Sem Tempo” e ficou em segundo lugar.
Em conversa com a NiT, o artista falou sobre a sua vida amorosa, os planos que tem para 1974 — não se entusiasme porque “não são nada de especial” — e sobre o atual governo português. Leia agora a entrevista.
Há cerca de duas semanas, o Paulo representou Portugal na Eurovisão. O que é que mudou desde aí e até hoje?
Mudou uma coisa que sempre tentei mudar quando as pessoas utilizam essa expressão que usou na pergunta: “representou Portugal”. Eu não representei Portugal nenhum. Eu representei a RTP, que é a companhia que faz o festival. No que diz respeito à minha vida normal, não mudou grande coisa. A profissional é a mesma. Fui aperfeiçoando o que faço. Fiz força para mudar a minha forma de funcionar e acho que consegui. Tem muito a ver com a seriedade na profissão.
Para o verão de 1974, quais são os seus planos?
Não são nada de especial. As pessoas agora dizem-me que sou o fulano que as representou na Eurovisão, mas vou continuar a cantar onde for solicitado.
Vai lançar novos temas ainda este ano?
Sim, lançarei sempre novos temas. Isso é sempre algo que penso em fazer. Estou sempre a pensar no que é que vou fazer ou não. Às vezes sai com facilidade, outras vezes não sai. As canções que nós fazemos dependem muito mais das editoras quererem gravá-las ou não e se, sobretudo, as pessoas que estão à frente das editoras acham que é comercial ou não é comercial. Normalmente vêm com aquela conversa do “Esta não porque não é comercial”. Mas pronto, eles lá sabem mais do que nós.
Como é que é o seu dia a dia em Lisboa? Onde é que vive e que sítios gosta de visitar?
Vivo bem perto do Palácio dos Coruchéus. Gosto de ir à Avenida de Roma e, sobretudo, ao café Vavá. De preferência, levanto-me por volta do meio-dia ou das 13 horas e saio disparado para o almoço. Normalmente salto o pequeno-almoço. Depois, há sempre trabalho para fazer com alguém e combinações musicais. Também há espaço para saídas à noite, idas ao cinema, aos teatros, boates com ou sem música ao vivo. Frequento lugares como O Porão da Nau, que está aberto até às seis da manhã e onde se come um maravilhoso bife. Mas antes disso costumo ir ao Stones, onde me encontro com os meus amigos. Eles bebem um copo, mas esse não é o meu caso porque apanhei uma bebedeira com 15 anos e enjoei com tudo o que é álcool. A minha vida não é difícil. Sou um fulano que tem uma profissão de que gosta e que é aceite por muita gente do público.
O Paulo namora ou é um homem solteiro?
Sou um homem divorciado, mas já com um segundo amor. É esta a minha vida.
Como é que olha para o estado do País em termos sociais e políticos?
Nunca fui um chamado combatente antifascista. Eu sou da música, sei que há uma censura e que há gente presa, mas não sou um lutador nesse sentido. Mas com o passar do tempo confesso que aprendi muito sobre política. Política é algo que todos fazemos quando, por exemplo, discutimos ou dizemos que o bife está mais caro ou que a gasolina aumentou de preço. Acho que isso é política. A outra questão é a política partidária.
Quais são as suas expetativas para os próximos anos?
Nunca pensei muito nisso, embora me preocupe mais com o que vou fazer do que com aquilo que já fiz. O que já fiz serve para perceber como é que as coisas foram, mas a caminho sempre de qualquer coisa que ainda virá. As minhas perspetivas, quer seja para um trabalhador rural ou para um músico, é que o País possa melhorar.