Esta quinta-feira, 22 de dezembro, a grande estreia nos cinemas é “Os Fabelmans”, o novo filme de Steven Spielberg. No entanto, há outra produção a que vale a pena prestar atenção: falamos de “Whitney Houston: I Wanna Dance With Somebody”, o filme biográfico sobre a célebre cantora.
Realizado por Kasi Lemmons (“Harriet”) e escrito por Anthony McCarten (“A Teoria de Tudo” e “Os Dois Papas”), o filme acompanha a carreira de Whitney Houston ao longo dos anos. A atriz Naomi Ackie interpreta a artista que morreu em 2012, com apenas 48 anos, vítima de afogamento provocado por consumo de cocaína e uma doença cardíaca.
Um dos episódios mais marcantes no percurso de Whitney Houston, e que também é referido neste filme, é a sua participação em “O Guarda-Costas” — quando se estreou como atriz e também fez a sua versão de “I Will Always Love You”, que se tornou mesmo num dos seus temas mais marcantes.
Em novembro assinalaram-se os 30 anos desde a estreia do filme, que chegou aos cinemas em 1992. E o ator que contracenou com Whitney Houston e foi decisivo para que ela aceitasse o papel e cantasse aquela música, Kevin Costner, prestou tributo à sua querida amiga com uma publicação nas redes sociais em que anunciava o regresso temporário de “O Guarda-Costas” a alguns cinemas norte-americanos, de forma a celebrar o aniversário redondo.
Contudo, a história de “O Guarda-Costas” é bastante anterior. O argumentista Lawrence Kasdan escreveu os primeiros esboços do guião em 1975. Inicialmente, Diana Ross e Steve McQueen iriam interpretar os protagonistas — ela seria uma estrela da música com uma aura de diva; ele um homem simples e reservado, que tinha sido agente dos serviços secretos e agora tornava-se o seu guarda-costas.
O projeto teve avanços e recuos ao longo dos anos. 67 versões do argumento foram rejeitadas. Os atores destacados para o projeto também se alteraram. E ele só se terá concretizado quando Kevin Costner, que lera e gostara do guião, se tornou uma estrela com “Danças com Lobos” (1990). A partir daí os estúdios acharam viável avançar com o projeto. E Kevin Costner tornou-se uma parte essencial da produção, ajudando a moldar o guião e a fazer com que o filme fosse para a frente.
No início dos anos 90, Whitney Houston tinha-se tornado uma enorme estrela internacional da música pop. Embora não tivesse qualquer experiência na área da representação, Kevin Costner considerou que era a pessoa certa para ficar com o papel em “O Guarda-Costas”. “Eu via-a como qualquer homem de sangue vermelho a via: achava que ela era muito bonita”, disse mais tarde numa entrevista.
Os estúdios não aceitaram de imediato esta hipótese. Percebiam o argumento de que poderia ser uma cantora a fazer a personagem, mas não estavam convencidos. “Fui relembrado que este seria o seu primeiro papel. Houve a sugestão de que poderíamos pensar noutra cantora. Talvez alguém branco. Nunca ninguém o disse em voz alta, mas era uma questão. Haveria um grande mediatismo à volta disto. Talvez uma atriz mais experiente fosse a escolha mais acertada. Era óbvio que eu tinha de pensar mesmo sobre isto”, recordou Kevin Costner em 2012, durante as cerimónias fúnebres de Whitney Houston.
Ao mesmo tempo, a cantora sentia-se insegura em relação às suas capacidades para fazer o papel. Não aceitou logo. Só o fez depois de Kevin Costner lhe ligar e conversarem, com o ator a assegurar-lhe que ele não a deixaria fazer nenhuma figura triste. “Prometo que não te vou deixar cair. Vou-te ajudar”, terá dito Costner na altura.
Ainda assim, o projeto teve de estar em pausa durante um ano, porque Whitney Houston estava a meio da digressão de apresentação do seu terceiro álbum, “I’m Your Baby Tonight”. Só depois é que as filmagens puderam começar. Kevin Costner acompanhou-a no teste de imagem que teve de fazer, dando-lhe força e fazendo-a perceber que era capaz. “Eu perguntei: porquê eu?”, explicou mais tarde Whitney Houston numa entrevista. “E ele respondeu: ‘Porque tu és a única que consegue cantar’.”
Kevin Costner falou precisamente das inseguranças de Whitney Houston no seu funeral. “Talvez aquela que era a maior estrela pop do mundo não achasse que era boa o suficiente. Whitney, se me pudesses ouvir agora, dir-te-ia: tu não só foste boa o suficiente, como foste enorme. Cantaste a canção sem banda. Fizeste aquele filme.”
Terá sido o próprio Costner a sugerir a Whitney Houston que cantasse acapella o início daquele tema de Dolly Parton, “I Will Always Love You”, que se tornou na música mais popular do ano — e numa das canções mais emblemáticas de toda a carreira de Houston — ao integrar a banda sonora do filme, que foi um sucesso de bilheteira.
“Muitos homens poderiam ter feito aquele papel, mas tu, Whitney, acredito verdadeiramente que eras a única que poderia ter interpretado a Rachel Marron naquela altura. Não só eras bonita, eras tão linda como uma mulher poderia ser. E as pessoas não só gostavam de ti, Whitney, elas amavam-te”, disse, emocionado, o ator. “E assim vais, Whitney, assim vais. Escoltada por um exército de anjos até ao teu pai divino. Quando cantares perante ele, não te preocupes. Vais ser boa o suficiente.”
Quando Whitney Houston morreu em 2012, Kevin Costner partilhou a frase: “Ela foi o meu verdadeiro amor”. Os dois nunca tiveram qualquer relação amorosa — Whitney Houston até se casou na altura do filme, mantendo uma relação de 15 anos com Bobby Brown; e Costner era casado há muitos anos com Cindy Silva — mas tiveram sempre uma ligação especial e platónica. Depois de “O Guarda-Costas”, Whitney Houston participou em vários outros filmes, dando continuidade ao seu trajeto enquanto atriz.
Nesse mesmo ano de 2012, Costner foi entrevistado num programa de televisão e revelou que, nos anos anteriores, tinha escrito várias cartas a Whitney Houston, com a esperança de que a pudesse ajudar nas suas adições — que acabaram por resultar na sua morte. “Não sei se aquelas cartas alguma vez foram lidas, mas ela sempre esteve perto de mim, sempre foi alguém que apreciei.”
Os dois cresceram em ideias baptistas e também tinham isso em comum. “Era fácil para nós rirmos. A igreja era o que conhecíamos. Era a nossa ligação íntima.”