Licenciada em arquitetura, Nádia Santos, 43 anos, trocou as linhas pela restauração em 2013. Juntamente com Miguel Leitão, de 48 anos — engenheiro mecânico que também deixou a carreira para se dedicar à cozinha —, abriram o primeiro de três restaurantes em Coimbra. Miguel decidiu tornar-se chef e aprofundou os seus conhecimentos em formações em França e Itália. Nessas viagens, conheceu vários especialistas em bebidas, despertando o seu fascínio pelo universo dos destilados.
O casal começou a produzir cerveja artesanal “por brincadeira” para os três restaurantes que geriam, mas o que começou como um passatempo transformou-se num projeto sério. Em 2022, já tinham vendido os restaurantes e fundado a Black Wolf, dedicada à criação de whisky e gin.
“No início era apenas um hobby, mas rapidamente se transformou numa paixão. Com o feedback positivo dos nossos clientes, percebemos que havia potencial para ir mais longe. A transição da cerveja para o whisky foi natural, pois os processos de produção são semelhantes”, explica Nádia à NiC.
A empreendedora descreve o seu processo de aprendizagem como “um percurso de pesquisa incessante, com tentativas e erros, muitos testes, insistência e várias receitas ensaiadas”, aliadas a formações em mixologia e destilação na Heriot-Watt University.
As visitas a destilarias na Escócia e Estados Unidos e as conversas com especialistas na área também ajudaram o casal a adquirir as ferramentas necessárias para iniciarem a produção. “O mundo das destilarias é muito engraçado. É bastante acessível, pois as pessoas estão abertas a partilhar conhecimentos e não guardam segredos”, explica.
A identidade da Black Wolf reflete a personalidade do casal, fundamentada em valores de pertença, família, lealdade e força, inspirando-se na imagem de uma alcateia. Inicialmente, a produção foi bastante modesta, porém, no final do ano passado, equiparam a destilaria com novos equipamentos e melhorias.
No início de junho lançaram os dois primeiros produtos da marca: o whisky “Lupus Signatus” e o “Fenrir Gin Original”. As garrafas, com 70 centilitros cada, estão à venda com preços promocionais de lançamento — 38,6€ e 27,8€, respetivamente — durante aproximadamente um mês.
Sobre o whisky, Nádia destaca que é o primeiro em Portugal produzido inteiramente com centeio, um cereal escolhido pelo seu sabor característico e picante, que o diferencia de outros feitos com cevada ou milho. “Embora seja mais difícil de trabalhar, acreditamos que oferece uma paleta de sabores única e bastante suave, o que nos permite criar um produto com uma identidade própria”, explica. Envelhecido durante três anos em barricas de carvalho americano novo e ex-bourbon, apresenta notas de baunilha, cereja e frutos secos. “É o nosso produto inaugural e gostamos muito dele”, acrescenta.
O segredo reside no processo de destilação, realizado num alambique de coluna avançado, raro em Portugal. Este equipamento permite múltiplas destilações num só ciclo, purificando o destilado e concentrando os aromas desejados. Uma coluna adicional possibilita um controlo rigoroso e preciso sobre a separação e retenção dos aromas mais subtis e complexos, “elevando o perfil sensorial das bebidas”.

Nádia considera que o mercado nacional não é suficientemente explorado no que diz respeito à produção de whisky, apesar da “imensa tradição de destilar” no País. “Há imensa cerveja artesanal, mas também é possível produzir whisky de excelente qualidade em Portugal“, defende.
O segundo produto da Black Wolf, o gin, é inspirado na botânica portuguesa. A receita foi idealizada por Nádia e inclui ingredientes como zimbro, alecrim, laranja, limão, maçã, flor de sabugueiro e pimenta rosa — que “veio dar um toque complementar”. Estará à venda, num primeiro momento, por 29,80€.
O alambique possui um gin basket, que permite a infusão a vapor dos botânicos, extraindo os óleos essenciais de forma suave e completa. “Temos sempre imenso cuidado com as matérias-primas que usamos. A qualidade não é negociável”, diz.
O compromisso com a sustentabilidade ambiental é também uma prioridade para o casal. Todos os ingredientes são reaproveitados: o grão utilizado na produção do whisky, por exemplo, é doado à agricultura local, evitando desperdícios. A fruta utilizada nos gins é desidratada e reaproveitada para cocktails, uma vez que apenas as cascas são utilizadas na fabricação.
A água, empregue no arrefecimento das bebidas, é também reutilizada, sempre que possível. “Todos os litros que gastamos no processo de destilação são guardados para incorporarmos novamente no processo ou até para as limpezas do local. Se está boa, pode ser aproveitada, mas nunca perdida”, afirma.
As bebidas da Black Wolf podem ser adquiridas online ou na própria destilaria, mediante marcação. No futuro, os proprietários planeiam abrir as portas para visitas guiadas, com duração de cerca de uma hora. “Temos todo o gosto em que as pessoas venham perceber como é que se faz, até porque não há muitos espaços que o permitam. Queremos oferecer essa experiência diferenciadora”, salienta.
Carregue na galeria para ver algumas imagens do espaço da Black Wolf e das novas bebidas.