Se quer provar um dos melhores vinhos do mundo, produzido na região centro do País, tem de se apressar. O Rabarrabos 2020 acaba de ser lançado pela Fundação ADFP — Assistência, Desenvolvimento e Formação Profissional, mas este ano só foram produzidas 3000 garrafas.
É tinto, de cor escura, quem o bebe sente a “frescura, o equilíbrio da compota madura e a baunilha, é envolvente e tem um sabor muito simpático entre a madeira e os frutos vermelhos”. Na boca fica “uma envolvência, uma untuosidade e no final uma acidez”. A descrição é de Gonçalo Moura da Costa, 39 anos, enólogo da fundação e responsável pela produção de Rabarrabos desde a sua criação, em 2017.
A vinha que produz esta relíquia está no concelho de Penela e tem uma área de cerca de 1,7 hectares, com as castas touriga nacional, trincadeira e aragonês que são vindimadas e vinificadas em conjunto. Depois da colheita e produção, o vinho é sujeito a um estágio mínimo seis meses em barricas de carvalho americano, na adega da fundação, em Miranda do Corvo. Aí é feita uma prova cega que dará o veredito final e dita se vai ou não ser ano de Rabarrabos.
“Como esta é uma marca premium da FADFP, não há garantia que seja lançado todos os anos, já que obedece a um critério de seleção rigorosa para que os padrões da qualidade e prestígio se mantenham em todas as edições”, explica Jaime Ramos, presidente da instituição. Gonçalo Moura da Costa confirma: tem de estar no “patamar de excelência” para passar para mais seis meses, no mínimo, de estágio em garrafa. No primeiro ano, 2017, a produção rendeu 6000 garrafas, em 2019 foram 5000, este ano só há 3000. “Se não estiver nos padrões exigidos, não é Rabarrabos. Engarrafamos na mesma, mas com outras marcas”, diz o enólogo, falando dos vinhos Terras de Lamas ou Paixão Natural, também da ADFP.
Determinante é a localização. A vinha está num vale, no concelho de Penela, entre dois montes que a abrigam, mas não lhe tiram o sol constante. A juntar a isso o calcário do terroir e a brisa Atlântica permitem que este vinho de Identidade Geográfica Beira Atlântico sub-região Terras de Sicó mereça a aprovação nacional e mundial. Medalhas de ouro em concursos como o Berliner Wine Trophy 2021, o Asian Wine Trophy 2021, o Portugal Wine Trophy 2021 ou o italiano Mondial des Vins Extreme – edição de 2020 atestam isso mesmo.
Se o vinho não deixa ninguém indiferente, o nome é inquietante. Rabarrabos é como se chama a vinha e era a antiga denominação da aldeia onde está localizada, hoje São Sebastião. “No início do lugar, onde passavam os Caminhos de Santiago, havia uma lagoa onde os peregrinos lavavam o rabo e por isso começou por se chamar Lavarrabos, depois passou a Rabarrabos e, na década de 50 do século XX, mudou para São Sebastião”, desvenda Gonçalo Moura da Costa, que apesar de bairradino, nascido na Mealhada, é apaixonado pelas terras de Sicó.
Já se percebeu que este é um vinho exclusivo, quer pelas suas caraterísticas, quer pelo terroir, mas o que o torna verdadeiramente único é ser também inclusivo. Então, mas é exclusivo e inclusivo ao mesmo tempo? É mesmo isso. É que metade das pessoas que trabalham na vinha são utentes da Fundação ADFP. “O projeto vitivinícola é um complemento da função social da fundação, sendo por isso inclusivo, procurando ocupar e criar postos de trabalho para pessoas com handicaps, e fonte de receitas para contribuir para a sustentabilidade e ajudar mais pessoas”, esclarece Jaime Ramos.
Foi essa vertente humana que fez também Gonçalo Moura da Costa ligar-se ao projeto. Agrónomo de formação, dedicou-se desde sempre à enologia. Esteve em casas como as Caves Messias, mas buscava a “ruralidade”. Por isso, há 17 anos fixou-se na sub-região Terras do Sicó. Quando conheceu a “parte social” da Fundação, que apoia pessoas com deficiência, doentes crónicos, vítimas de maus-tratos ou refugiados, soube que era ali que queria ficar.
Estes e outros vinhos da produção da Fundação ADFP podem ser encontrados e adquiridos na Loja de Artesanato do Parque Biológico da Serra da Lousã, em Miranda do Corvo, ou então através de encomenda para o email do enólogo (goncalocosta@nulladfp.pt). Online está disponível na Garrafeira Nacional, e em Coimbra, na Garrafeira de Celas e na Degostar, Vinhos e Experiências. Cada garrafa custa 15€ e a totalidade da receita reverte para os projetos da instituição.